quinta-feira, 5 de maio de 2011

A História não inicia nem termina conosco

   Não é hábito entre nós, homens de maior ou menor pensamento, refletir sobre afirmação tão óbvia. Somos até capazes de dar-lhe de ombros.
   Tenho grande alegria em pensar na idéia do “tempo-eixo” de Karl Jasper e, espero que ele dê alegria aos que já o conhecem, assim como a todos os outros possíveis leitores.
   Com o risco de esvaziar o conceito, o pensador mencionado construiu a idéia de que existem determinados tempos históricos que foram capazes de promover uma inflexão na história dos homens, isto é, um tempo que nos levou para uma determinada direção no sentido do nosso modelo cultural sob todos os seus aspectos.
   Jasper dizia que o tempo-eixo, aquele que levou o ocidente para a direção que este tomou se constituiu pelas grandes transformações ocorridas entre os séculos VIII - II a.C., tendo como espaço geográfico-cultural a China, a Índia, o atual Irã, no Oriente e a Grécia e Israel no Mediterrâneo.
   É evidente que a partir daí surgem uma infinidade de questões e problemas a serem resolvidos: Como o cristianismo se amalgamou com toda essa herança cultural? Quais particularidades do cristianismo permitiram a síntese que resultou no momento histórico identificado como o da “cristandade”, na Idade Média? E como esta cedeu o lugar para a Idade Moderna, com a ciência e toda uma cultura, essencialmente leiga?
   A maioria de nós discorre com alguma facilidade sobre o fato de a Revolução Renascentista ter como o centro gravitacional o homem, retirando de Deus a primazia que lhe havia sido dada pela Idade Média. - O Renascimento foi uma Revolução Antropocêntrica, dizemos com alguma carga de magia. O Humanismo Renascentista ocorreu como se diz, através de um retorno à Grécia e a Roma Antigas e a Ciência teria se consolidado no Século XVII, promovendo um afastamento do homem, da Teologia e, sobretudo, da Cristandade como Modelo Civilizatório. Inaugurou-se o período do Estado Leigo até desembocarmos no Humanismo Oitocentista, com o Terceiro Estado da Evolução do Conhecimento e, em seguida, à hegemonia definitiva e libertadora da Razão e da Ciência. - Viva a igualdade, a liberdade e a fraternidade, mas, desde que esta última não nos importune com suas exigências coletivas e nuanças religiosas. - Que se consolide o indivíduo burguês. - Por décadas a fraternidade foi categoria proibida de constar no ideário pós-revolucionário de 1789.   
   Mas penso que vem de se perguntar: e como ficou nesse processo o Cristianismo? E a Tradição Hebraica, com a sua cultura monoteísta, com a idéia da universalidade religiosa, de libertação do homem de toda escravidão? Onde foram parar as suas Escatologias? A idéia de transcendência? Será que nada do que foi criado a partir da modernidade se originou dessa cultura milenar que fez com que o Advento do Cristo se transformasse num marco temporal, portanto, paradigmático? – Muitas perguntas!
   Vem de pensar que, além daquilo que diz Jasper, houve para nós, de hoje, um Tempo-Eixo (Axial), cujas matrizes culturais mais evidentes são a Tradição Grega, a Tradição Latina, a Cultura Bíblico-Cristã e a Racionalidade Moderna com a conquista extraordinária do Iluminismo, da Ciência e da Tecnologia.
   Parece ser esta a cultura que se encontra numa crise que favorece uma nova aventura para toda a humanidade. Uma aventura que não prescindirá de nada de toda esta tradição e, nem do Marxismo, da Psicanálise, da informática e da Telemática, da Semiótica, do Desenvolvimento Informacional, do Indivíduo como conquista da modernidade, dos signos analógicos, mas, também da Herança Judaico-Cristã e, sobretudo do Cristianismo, redimensionado a partir de sua mensagem central, isto é, “Deus é Amor” e “amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. O resto é ideologia.  

quarta-feira, 27 de abril de 2011

UM IDEAL PARA HOJE!


      Quando olhamos para trás, vemos o quanto é verdade que a humanidade é extraordinariamente capaz de se reinventar e que esta estória de que “antigamente é que era bom” é, no mínimo, uma percepção equivocada de quem está vendo o seu tempo passar, inexorável, em direção a outro que, embora possa ter muito do passado e do presente, será totalmente novo.
     Assim, cabe-nos saber colher o rumo da história, os sinais dos tempos e aprendermos a ver que é impossível que hoje seja pior do que ontem porque o tempo para se viver é hoje e este é o melhor de todos, isto é, o nosso tempo, o tempo que não será vivido por ninguém mais a não ser por nós mesmos.
     De certo modo, quando se diz que estamos vivendo o fim da história, ou, que estamos nos estertore da espécie humana e que estamos indo em direção à barbárie, que chegamos ao fim da idéia de futuro, estamos, na verdade, sob a influência de uma forma de pensar que predomina no Ocidente desde o início da Idade Moderna e que se considera absoluta e definitiva.
    Não se esperava que para além das conquistas modernas fosse possível o retorno de velhas perguntas e o aparecimento de novas demandas humanas, para as quais as luzes da modernidade não tivessem respostas.
    Esplêndido! Basta que o homem que nasce com a modernidade acolha a idéia verdadeira de não ser Deus. - Poxa, diante de tantas conquistas que nos trouxe O Iluminismo e a Ciência, nem é tão grave assim. Só não conseguimos ser Deus e nem matá-LO como previram tantos, como também não fomos capazes de nos apoderarmos da árvore do conhecimento. Um pouco de humildade, talvez nos esteja faltando e nos fizesse bem.
     Um Novo Humanismo não se dará sem uma recolocação dessas realidades em seus devidos lugares.
     Religião e Ciência, Deus e o Homem, não são excludentes, mas, alto lá, também não permitem sínteses ideológicas porque os resultados destas aproximações sempre foram catastróficos para a História da Humanidade.
     Estas duas coisas, Ciência e Religião, pertencem como nos lembra Stanley Gould, a Magistérios não Intervenientes e devem se respeitar reciprocamente. As sínteses verdadeiras serão, sempre, resultado da vida, de experiências antropológicas, portanto, humanamente individuais e coletivas. Jamais ideológicas e intelectuais.
     O homem do humanismo que resultará da atual experiência da humanidade talvez seja o Homem-Deus porque o Deus deste homem é o Deus da Imanência que se encontra no coração de cada um de nós humanos, independentemente das culturas e dos credos que, sem negar a dimensão transcendente do Deus, inaugurará também uma Nova Transcendência e uma Nova Escatologia que é aquela de uma Sociedade mais justa, fraterna e unida em torno de uma única lei que é aquela de nos reconhecermos todos como irmãos, feitos para a fraternidade que parece ser, cada vez mais, o único caminho capaz de superar a “auto-propulsiva e enlouquecida circulação do capital”, (assim Slavoj Zizek resume Marx) que, por ser uma experiência histórica chegará, também, a sua exaustão.
      - Uma sociedade fraterna, fundada na cultura da partilha. Este é um Ideal pelo qual vale a pena viver hoje

quinta-feira, 21 de abril de 2011

ABERTURA

Sou daqueles que acredita, profundamente no ser humano. Na linha de grandes autores, acredito que a história será sempre consequência da capacidade do gênero humano em adequar-se às novas situações, quer sejam estas de caráter natural ou histórico.

A Mão Enorme                                                         Pássaro Avoado


Dentro da noite, da tempestade,                                                             I
a nau misteriosa lá vai.
O tempo passa, a maré cresce,                                 Vaso partido
o vento uiva.                                                             O mundo vaga
A nau misteriosa lá vai.                                             órfão de Hércules.
Acima dela
que mão é essa?                                                      Ababelado
Mão do piloto?                                                         Zeus chora
Mão de quem é?                                                      a morte de Cronos.
A nau mergulha,
o mar é escuro,                                                         Em estilhaços
o tempo passa.                                                         corredeiras precipitam
Acima da nau                                                           a face de Narciso
a mão enorme
sangrando está.                                                        Finda o horizonte para as flores 
                                                                                                  [da aurora das fontes.
A nau lá vai.
O mar transborda,                                                                              II
as terras somem,
caem estrelas.                                                           Fecham-se os oráculos
A nau lá vai.                                                             antes as cartas
Acima dela                                                               da última explosão da criação
a mão eterna
lá está.                                                                      Em algumas ilha Deus aguarda
                                                                                 A ciência concluir
                                                                                 A decomposição de seu criador.
                                                                                 Sobre ondas magnéticas
                                                                                 deuses de barro aportam
                                                                                 o estridente silêncio
                                                                                 das salas-de-jantar.


                                                                                 Erra a poesia por entre abismos, â espera 
                                                                                                             [da ressureição do verbo.

                                                                                                    III
                                                                              
                                                                                Alguma arca
                                                                                recolherá os anjos
                                                                                do andar superior?